Carta aberta ao Excelentíssimo Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso
Carta
aberta ao Excelentíssimo Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso
Temos
visto nas últimas semanas vários casos de espionagem cibernética envolvendo o
nosso país e nesta semana foi noticiado o caso em que o Brasil monitorou
diplomatas da Rússia, Iraque e Irã entre 2003 e 2004[1]. Contudo,
antes de entendermos a situação, devemos entender o que são espionagem e
contraespionagem em questão.
A palavra
espionagem tem origem no francês espionnage e
vários outros idiomas mantiveram a sua mesma morfologia como o inglês
(espionage), o alemão (spionage), o italiano (spionaggio), o russo (шпионаж -
shpianash) e espanhol (espionaje). Segundo o dicionário online Michaelis[2], espionagem significa “1 Ato
ou efeito de espionar. 2 Encargo
de espião. 3 Conjunto
de espiões.”, sendo espionar “1 Espiar, espreitar ou investigar como
espião. vint 2 Praticar atos de espião. vtd 3 Investigar.”. Se
pegarmos a definição de Sun Tzu[3], podemos definir espionagem
como uma prática de
obter informações de caráter secreto ou confidencial sobre governos,
organizações ou cidadãos, sem autorização destes, para alcançar certa vantagem militar,
política, econômica, tecnológica ou social.
Portanto, podemos concluir que contraespionagem, segundo o mesmo dicionário
online Michaelis, é “sf (contra2+espionagem)
Atividade que objetiva a descoberta e frustração da espionagem inimiga.” E nesse ponto o Sr. está certo quanto ao uso e motivo da
contraespionagem, mas infelizmente não foi esse o caso aplicado pelo Brasil.
O Sr. declarou
a seguinte frase conforme noticiado por vários meios de comunicação em
05/11/2013:
“Vejo situações completamente diferentes [ação do
Brasil e dos EUA]. Qualquer tentativa de confundi-las me parece equivocada. O
que o Brasil sofreu foi violência do sigilo, violação de mensagens, de
ligações. A violação dos Estados Unidos afronta a nossa soberania e o Brasil teve reação
forte. E o mais importante, e vale ressaltar, ela [ação praticada pelo Brasil]
foi feita em território nacional”.
Devemos ressaltar que o Brasil praticou o mesmo
tipo de ato dos EUA, porém de formas diferentes, pois a intenção de ambos os
Estados era a de obter informações. E não é pelo fato de essas ações terem sido
praticadas em território nacional que isso não implica no ato de que afrontamos
a soberania Russa, Iraniana e Iraquiana, pois os casos ocorreram contra
representantes dos governos desses Estados.
Voltando as
suas palavras:
“O que li foi
que houve contraespionagem. Isso é absolutamente legal nas regras. Quando você
acha que há espiões atuando no Brasil, você deixa de espionar? Não. Você faz a
contraespionagem, para saber se eles estão espionando ou não. Não vejo nenhum
abalo. Todos os países fazem e têm que fazer contraespionagem. O que não posso
fazer é violar a soberania das pessoas. Contraespionagem não é espionagem. Ao
que li, não houve interceptação não autorizada pelo Judiciário, não houve
ofensa à lei”.
Contraespionagem não é baseada em “achismos” – quando você
supõe que há espiões em seu território ou acredita estar sendo espionado sem
provas. Você só pratica contraespionagem quando há a certeza, comprovada, de
ações de espionagem contra o seu Estado e cidadãos, como a própria definição
semântica do termo nos permite analisar o fato. O Brasil praticou pura e
simples espionagem e de uma forma extremamente rudimentar e atrasada. Quanto ao
fato dos atos não terem ferido a lei brasileira, isso é algo que devemos tomar
cuidado ao falar, pois nossos atos podem ter sido baseados pelas nossas leis,
mas podem ferir as leis dos países espionados. Vide o caso dos EUA e sua
espionagem contra o Brasil. Seus atos foram todos legalmente baseados e
aprovados pelo congresso norte-americano (vide a lei FISA de 1978 e seus amendments e a NSA warrantless surveillance[4]).
Vale ressaltar que em
qualquer embate diplomático, militar ou cibernético, os EUA tem uma enorme
vantagem sobre o Brasil, independente de termo-nos tornado um grande expoente
diplomático e um grande crescimento militar, sendo o Brasil considerado como a
10º maior potencia bélica do mundo por alguns estudos.
Portanto, Excelentíssimo Ministro, podemos
concluir que devemos tomar cuidado com o que expomos e como expomos pois
espionagem é praticada por todos os Estados, inclusive pelo Brasil, e que não
devemos justificar nossas atitudes através de falsas escusas, mas sim investir
mais em nosso sistema cibernético e em nossa inteligência para que possamos ter
uma apropriada ação preventiva com um serviço atuante de inteligência contínua,
identificando ações de espionagem e, com isso, praticar a contraespionagem e,
também, competir em tom de igualdade com as grandes potências da área.
Cordialmente,
Larissa Frade e Bernardo Lobão – Analistas de
Relações Internacionais pela CEGTE – Consultoria em Estudos sobre Guerras,
Terrorismo e Estratégia.
[2] <http://michaelis.uol.com.br/> Acessado em: 06/11/2013.
[3] TZU, Sun. “A ARTE DA GUERRA”.
1ª Edição. L&PM Editores, Outubro, 2000. 144 páginas. (Coleção L&PM Pocket).
[4] < https://www.fas.org/irp/agency/doj/fisa/>.
Acessado em: 06/11/2013.
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